Redução da jornada de trabalho

Impactos nas relações de trabalho

Por Guilherme Neuenschwander Figueiredo e João U. Santana Junior

 

 

A proposta de redução da jornada de trabalho para quatro dias na semana: Impactos na saúde do trabalhador e na competitividade das empresas

A proposta de reduzir a jornada de trabalho para quatro dias na semana, com três dias de descanso, tem se destacado no debate sobre as condições de trabalho no Brasil e no mundo. Atualmente, a legislação brasileira estabelece um limite de jornada de 44 horas semanais, limitando-se a jornada diária a 8 horas, e um máximo de 2 horas extras, voltando a discussão da possibilidade de redução à pauta, sendo crescente o movimento de flexibilização, independentemente da redução da remuneração.

A presente análise objetiva realizar um breve exame dos impactos de eventual redução da jornada semanal e diária, sem a redução da remuneração, levando em consideração o histórico da evolução da jornada de trabalho no Brasil, os benefícios e desafios para a saúde dos trabalhadores e a competitividade das empresas, além de exemplos internacionais que possam oferecer insights relevantes.

A evolução histórica da jornada de trabalho no Brasil

O Brasil, antigamente escravocrata, passou por diversos processos que levaram a melhoria das condições de trabalho, desde a abolição da escravatura e início dos movimentos operários, os quais, intrinsicamente, apresentam ideologias socialistas, havendo dentre estes, aqueles que acreditavam em uma afronta direta aos “patrões” e Estado, sobretudo através de greves (anarquistas), aqueles que acreditavam no atingimento do poder pela classe operária por meio de uma revolução, e outros que acreditavam na ascensão da classe de forma democrática, sendo fundado em 1892 o Partido Operário Socialista.

Independentemente da corrente seguida, estes movimentos objetivavam melhores condições de trabalho, a conquista de direitos trabalhistas, como redução da jornada de trabalho, aumento salarial, férias, dentre outros.

Cita-se como principal conquista, a CLT – Consolidação das Leis Trabalhistas, em 1943, durante a era Vargas (1930-1945).

Nos anos recentes, a reforma trabalhista de 2017 introduziu flexibilidade no regime de trabalho, permitindo a adoção de novas escalas, como a jornada 12×36, e flexibilizando o regime de trabalho intermitente. Esta flexibilização das jornadas e constantes estudos em busca de modelos alternativos, como o home office e o trabalho remoto, abrem caminho para discussões mais amplas sobre a redução da jornada semanal, ganhando destaque atual a proposta de redução da jornada para quatro dias de trabalho e três de descanso, a qual gera, obviamente, entusiasmo da classe trabalhadora, e diversos questionamentos apontamentos restritivos de empregadores e profissionais envolvidos diretamente na economia brasileira.

Proposta de redução para quatro dias de trabalho e três de descanso

Intentando a propositura de emenda à Constituição (PEC), a deputada Erika Hilton, líder do PSOL, defendeu em Plenário a alteração da jornada para trinta e seis horas semanais, com limite de até oito horas diárias, sendo quatro dias de trabalho e três de descanso.

A “proposta” foi defendida por deputados da base do governo e criticada por parlamentares da oposição, os quais defendem a negociação de eventual redução nestes moldes não deve ser imposta, sem estudos de impactos e medidas efetivas que busquem proporcionar a viabilidade de uma redução de carga horária, sem a perda de produtividade, ou ainda, prejuízos à economia brasileira e saúde financeira das empresas, ao passo que a redução da jornada sem redução da remuneração se mostra nitidamente inviável economicamente.

Outrossim, atualmente, a redução de jornada sem redução de salário já é possível, mediante negociação direta entre empregado e empregador, não sendo factível justamente pela sua inviabilidade econômica.

Nada obstante os debates acalorados, cabe destaque o fato de que existem exemplos de outros países que implementaram a redução da jornada de trabalho, com resultados variados.

A Alemanha, por exemplo, se utiliza atualmente de uma jornada de 35 horas semanais em alguns setores, apresentando um alto índice de produtividade, decorrente de altos investimentos em inovação e automação.

Igualmente, a França também adotou a jornada de 35 horas semanais, também apresentando um crescimento econômico, o qual se mostra estável, apesar das resistências iniciais.

No Japão, país culturalmente conhecido por jornadas longas de trabalho, apontando estudos do ano de 2022 que 10% dos homens e 4% das mulheres trabalhavam mais de sessenta horas semanais, busca atualmente uma redução gradual da jornada de trabalho, enfrentando, contudo, resistência social e cultual, uma vez que o ambiente de trabalho se mostra como um dos principais espaços de interação social, prevalecendo a cultura de reuniões e jantares prolongados com colegas.

Em que pese o fato de o avanço tecnológico flerta com índices alarmantes de perda de postos de trabalho, os exemplos demonstram que é possível reduzir a jornada de trabalho sem comprometer a competitividade das empresas, desde que haja investimentos em tecnologia, gestão eficiente e políticas públicas de incentivo à inovação e, principalmente no Brasil, um estudo envolvendo especificamente a carga tributária imposta às empresas.

Pontos positivos:

Melhoria na qualidade de vida dos trabalhadores: A redução da jornada, com três dias consecutivos de descanso, proporcionaria mais tempo para o lazer, descanso e convivência familiar. Isso poderia resultar em uma significativa melhora na saúde mental e física dos trabalhadores, com redução do estresse, da fadiga e do absenteísmo, além de diminuir as doenças ocupacionais, como distúrbios musculoesqueléticos e problemas cardíacos, conforme apontam Santos e Pimenta (2020). O aumento do equilíbrio entre vida profissional e pessoal também está associado à redução da depressão e da ansiedade;
Aumento de produtividade a longo prazo: Apesar de uma jornada semanal mais concentrada, a proposta pode resultar em maior produtividade. Estudo de Tavares (2019) sugere que a diminuição do estresse e a maior satisfação no trabalho levam os empregados a se concentrarem melhor nas tarefas, melhorando o desempenho. O tempo adicional de descanso ajuda a aumentar a disposição e a energia, favorecendo a qualidade do trabalho;
Redução de custos com saúde e absenteísmo: A redução do estresse e das doenças ocupacionais pode diminuir significativamente os custos com a saúde, tanto para as empresas quanto para o sistema público de saúde. Com menos faltas e afastamentos, as empresas poderiam economizar com planos de saúde e licenças médicas;
Fortalecimento da imagem das empresas: Empresas que adotam jornadas de trabalho mais curtas e com maior flexibilidade podem ser vistas como mais responsáveis socialmente, o que melhora sua imagem perante os colaboradores e o mercado. Empresas que promovem o bem-estar dos trabalhadores se tornam mais atrativas para o recrutamento de novos talentos e podem alcançar um clima organizacional mais positivo.
Pontos negativos:

Aumento dos custos operacionais para as empresas: Uma das maiores preocupações das empresas é o aumento de custos. Para que as empresas mantenham a produtividade com uma jornada concentrada, será necessário contratar mais trabalhadores ou investir em tecnologias que otimizem o processo produtivo. Pequenas e médias empresas podem ter dificuldade para absorver esses custos adicionais, o que pode resultar em maior carga financeira, especialmente se não houver um aumento proporcional na produtividade;
Desafios na implementação em certos setores: A adoção de uma jornada de trabalho de quatro dias por semana pode ser mais difícil de implementar em setores específicos, como saúde, educação e serviços de transporte, onde a cobertura contínua é necessária. Esses setores já enfrentam jornadas de trabalho intensas e escalas pesadas, e a reorganização para se adaptar ao novo modelo poderia comprometer a qualidade do serviço prestado ou aumentar os custos com contratações temporárias;
Possível aumento da rotatividade e instabilidade no mercado de trabalho: Para algumas empresas, a redução da jornada pode resultar em maior rotatividade de funcionários ou a necessidade de recontratar mais pessoas para cobrir os turnos. Isso poderia gerar instabilidade no emprego e reduzir o comprometimento dos trabalhadores a longo prazo, como apontam Delgado (2020) e Tavares (2019). A transição pode também criar tensões dentro do mercado de trabalho, com desemprego temporário e reestruturações mal conduzidas.
Considerações finais

A proposta de redução da jornada de trabalho para quatro dias por semana pode trazer significativos benefícios para a saúde dos trabalhadores e para a competitividade das empresas, especialmente a longo prazo. Embora os custos iniciais possam ser elevados, as economias com saúde, a melhoria na produtividade e o fortalecimento da imagem corporativa podem compensar esses gastos. No Brasil, a adoção dessa medida exigiria um planejamento cuidadoso, com um suporte governamental adequado para apoiar as pequenas e médias empresas na transição, além de um incentivo à modernização do setor produtivo.

Em termos globais, países como Alemanha, França e Japão demonstraram que é possível adotar jornadas de trabalho mais curtas sem afetar a competitividade econômica, quando a transição é bem planejada e acompanhada de políticas de inovação. Se o Brasil seguir esse caminho, equilibrando as necessidades dos trabalhadores e das empresas, a redução da jornada de trabalho poderia ser uma estratégia eficaz para promover um bem-estar social sustentável e um crescimento econômico competitivo.

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GOMES, Irene. Agência IBGE Notícias, 15 set. 2023. Disponível em: https://agenciadenoticias.ibge.gov.br/agencia-noticias/2012-agencia-de-noticias/noticias/37913-taxa-de-sindicalizacao-cai-a-9-2-em-2022-menor-nivel-da-serie

CARONE, Edgard. Movimento operário no Brasil – Volume 1: 1877 – 1944. Editora Record, São Paulo, 1994.

GOMES, Irene. Agência IBGE Notícias, 15 set. 2023. Disponível em: https://agenciadenoticias.ibge.gov.br/agencia-noticias/2012-agencia-de-noticias/noticias/37913-taxa-de-sindicalizacao-cai-a-9-2-em-2022-menor-nivel-da-serie

PRADO, Caio Jr. Formação do Brasil Contemporâneo. Companhia das Letras, São Paulo, 2011.”

Veja mais sobre “Movimento operário brasileiro” em: https://brasilescola.uol.com.br/historiab/movimento-operario-brasileiro.htm

https://exame.com/carreira/japao-quer-implementar-semana-de-4-dias-no-trabalho-mas-enfrenta-desafios-culturais/

Epa! Vimos que você copiou o texto. Sem problemas, desde que cite o link: https://www.migalhas.com.br/depeso/423555/reducao-da-jornada-de-trabalho-impactos-nas-relacoes-de-trabalho