Publicada em 22 de março de 2020, Medida Provisória nº 927, de 22 de março de 2020 traz importantes prerrogativas aos empregadores
Como se trata de legislação deveras recente e em caráter emergencial, ainda é prematura qualquer conclusão quanto ao tema e termos do presente artigo legal, podendo ocorrer alterações ou complementações.
por Igor Sa Gille Wolkoff e João Ubirajara Santana Junior
Dispondo sobre medidas trabalhistas que podem ser tomadas por empregadores em enfrentamento aos brutais e já amargos impactos negativos decorrentes da pandemia causada pelo novo coronavirus (COVID-19), o Governo Federal publicou neste domingo, dia 22 de março de 2020, a Medida Provisória nº 927.
Tratando-se de hipótese de força maior, nos termos do disposto no artigo 501 da CLT, haja vista o reconhecido estado de calamidade pública e a emergência de saúde pública de caráter internacional, as disposições são ofertadas para o período de enfrentamento do estado de calamidade reconhecido pelo Decreto Legislativo nº 6, de 2020.
Dentre as disposições apresentadas para preservação do emprego e da renda, estão o teletrabalho, a antecipação de férias individuais, a concessão de férias coletivas, o aproveitamento e a antecipação de feriados, o banco de horas, a suspensão de exigências administrativas em segurança e saúde do trabalho, o direcionamento do trabalhador para qualificação e o diferimento do recolhimento do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço – FGTS.
Regime de trabalho já previsto no ordenamento brasileiro, o teletrabalho passa a ter com a MP importantes diferenças, cabendo destacar que não se aplicam, durante o período de calamidade pública, as regulamentações sobre trabalho em teleatendimento e telemarketing dispostas na Sessão II do Capítulo I do Título III da Consolidação das Leis do Trabalho, aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452.
O empregador passa a ter como alternativa para manutenção dos postos de trabalho a possibilidade de alteração do regime de trabalho presencial para o teletrabalho, o trabalho remoto ou qualquer outro tipo de trabalho a distância, inclusive para estagiários e aprendizes, podendo ser o regime revertido a qualquer momento, independentemente da confecção de acordos individuais ou coletivos, sendo ainda dispensado o registro prévio da alteração no contrato de trabalho, bastando a notificação do empregado com antecedência de, no mínio, quarenta e oito horas, seja por escrito, seja por meio eletrônico.
Neste quesito, a MP estipula que eventuais gastos com aquisição, manutenção ou fornecimento dos equipamentos tecnológicos e da infraestrutura necessárias devem constar em contrato firmado por escrito em até trinta dias da data da mudança do regime de trabalho, possibilitando ainda o fornecimento de equipamentos em regime de comodato pelo empregador, honrando este com a infraestrutura necessária, não sendo tais valores caracterizados como verbas salariais.
Cabe destacar que eventual período dispendido com o uso de aplicativos ou programas de comunicação fora da jornada normal de trabalho, somente será considerado como tempo à disposição, regime de prontidão ou de sobreaviso, caso haja previsão expressa em acordo individual ou coletivo.
A Medida Provisória apresenta ainda ao empregador a possibilidade de antecipação de férias individuais durante o estado de calamidade pública em evidência, reduzindo o prazo de aviso ao empregado de trinta dias para quarenta e oito horas, indicando por escrito ou por meio eletrônico o período de gozo.
O empregador tem a prerrogativa de quitar o adicional de um terço de férias após a sua concessão, até a data limite para pagamento da gratificação natalina prevista no art. 1º, da Lei nº 4.749, de 12/08/1965, sendo a conversão em pecúnia prerrogativa também do empregador.
Igualmente, o pagamento da remuneração das férias em testilha poderá ser efetuado até o quinto dia útil do mês subsequente ao início do gozo de férias.
O período de férias deve ainda ser superior a cinco dias corridos, havendo a possibilidade de concessão mesmo que o período aquisitivo ainda não tenha se completado, podendo ainda, empregado e empregador, mediante acordo individual escrito, a antecipação de períodos futuros.
Neste ponto, em que pese tratar-se de prerrogativa do empregador, a MP privilegia os trabalhadores que pertencem ao grupo de risco do coronavirus (COVID-19), tendo estes prioridade no gozo de férias individuais ou coletivas.
A contrario senso, pode ainda o empregador, nos termos da MP e observado o período de calamidade pública, suspender férias ou licenças não remuneradas de profissionais da área de saúde ou que desenvolvem funções essenciais, sendo estes comunicados preferencialmente com antecedência de quarenta e oito horas.
Quanto às férias coletivas, outro ponto tratado pela MP, há a possibilidade de antecipação do gozo de feriados não religiosos federais, estaduais, distritais e municipais, possibilitando a comunicação por escrito ou meio eletrônico dos envolvidos em no mínimo quarenta e oito horas.
Em se tratando de feriados religiosos, a MP prevê a necessidade de concordância do empregado, mediante acordo individual escrito.
A constituição de regime especial de compensação de jornada por meio de banco de horas é também uma das medidas dispostas na MP, através de acordo individual ou coletivo, prevendo a compensação em até dezoito meses, contados da data término do período de calamidade.
Ponto controvertido da Medida Provisória, a suspensão da obrigatoriedade de realização de exames médicos ocupacionais, clínicos e complementares, com exceção do demissional, assim como a obrigatoriedade de realização de treinamentos periódicos e eventuais dos atuais empregados previstos na NR – 1 deve ser analisado pelo empregador com atenção e sensatez, uma vez que eventuais agravamentos de patologias ou ocorrências durante o exercício das atividades pelo empregado permanecem sob a responsabilidade subjetiva do empresador.
Segundo a MP, o empregador poderia ainda suspender o contrato de trabalho pelo prazo de até quatro meses, para quer o empregado possa participar de cursos ou programas de qualificação profissional não presencial, oferecido pelo empregador, sendo desnecessária a confecção de acordo ou convenção coletiva com tal previsão, podendo ser previamente acordado diretamente com o empregado com anotação em CTPS.
Em que pese a previsão na MP publicada em 22 de março, o Presidente Jair Messias Bolsonaro afirmou no dia seguinte (23/03/2020) ter revogado o artigo referente a este tema específico.
Ainda, buscando desafogar o empregador, a Medida Provisória suspende a exigibilidade do recolhimento do FGTS dos meses de competência março, abril e maio, com vencimento em abril, maio e junho de 2020, possibilitando o parcelamento de tais valores, cabendo ao empregador, para fazer jus a tal benefício, declarar as informações até de 20 de julho de 2020.
A contagem do prazo prescricional dos débitos relativos ao FGTS resta suspensa pela MP pelo prazo de cento e vinte dias, contados de 22 de março de 2020.
Por fim, a Medida Provisória apresenta outras disposições como a possibilidade de prorrogação da jornada de trabalho no que se refere aos estabelecimentos de saúde, assim como aplicação de escalas de horas suplementares entre a décima terceira e a vigésima quarta hora do intervalo interjornada, sem que seja considerada infração administrativa.
Fica ainda estipulado que eventuais casos de contaminação pelo coronavirus (COVID-19) só serão entendidos como ocupacionais em caso de comprovação do nexo causal.
Outro ponto que traz maior segurança aos empregadores neste período incerto e de adaptações de cento e oitenta dias é o fato de a MP determinar que Auditores Fiscais do Trabalho do Ministério da Economia atuem de maneira orientadora, salvo situações taxativas, como falta de registro de empregado, a partir de denúncia; situações de grave e iminente risco, somente para as irregularidades imediatamente relacionadas à configuração da situação; ocorrência de acidente de trabalho fatal apurado por meio de procedimento fiscal de análise de acidente, somente para as irregularidades imediatamente relacionadas às causas do acidente; e trabalho em condições análogas às de escravo ou trabalho infantil.
Independentemente da iniciativa e inovações trazidas pela MP 927, as medidas sugeridas se aplicam a determinados setores e trabalhadores, desamparados milhares de trabalhadores autônomos e micro e médios empresários.
Os impactos na economia brasileira já se mostram devastadores, inclusive a diversos setores como de hotelaria, entretenimento e etc, os quais dependem intrinsecamente da circulação de pessoas, sendo que paralisação da circulação de pessoas se mostra a principal estratégia momentânea contra o avanço da pandemia.
O que se espera é que empregados e empregadores se mobilizem e se unam para que este período de incertezas seja superado da melhor forma possível.
Fonte:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2020/Mpv/mpv927.htm
https://g1.globo.com/politica/noticia/2020/03/23/bolsonaro-diz-que-revogou-trecho-de-mp-que-previa-suspensao-de-contratos-de-trabalho-por-4-meses.ghtml
Autores:
Igor Sa Gille Wolkoff é advogado atuante nas áreas trabalhista e empresarial e sócio da Advocacia Castro Neves Dal Mas coordenando a Unidade de Campinas. Possui especialização em Direito e Processo do Trabalho pela Faculdade Cândido Mendes e MBA em Direito Empresarial pela FGV
E-mail: igor@castroneves.com.br
João Ubirajara Santana Junior é advogado atuante na área trabalhista e sócio da Advocacia Castro Neves Dal Mas coordenando a Unidade de Campinas. Possui especialização em Direito e Processo do Trabalho pela PUC Campinas e atualmente MBA em Gestão e Business pela FGV.
E-mail: joao@castroneves.com.br