Por Lucas Ballardini Beraldo

Inegável destacar, primeiramente, que com o advento do CPC de 2015 no ordenamento jurídico pátrio, o processo do trabalho passou por uma grande mudança de paradigma, trazendo uma nova realidade à Justiça do Trabalho, tendo, a partir do início de vigência da novel legislação processual civil, sido expressamente consagrada, a sua aplicação nas demandas juslaborais, conforme bem preconizado no artigo 15 do dito Codex, aparando e eliminando quaisquer lacunas e arestas que se formavam sobre a aplicação do CPC ao processo do trabalho, quando vigente a legislação processual civil de 1973.

Neste sentir, na prática os ilustres e dignos magistrados de origem sempre tenham tido um maior destaque, por conduzirem por maior tempo a tramitação processual (sendo os norteadores do rumo da lide na definição da existência – ou não – do direito postulado – no processo de conhecimento, na contabilização e apuração matemática do valor atualizado devido ao credor – na fase de liquidação e na persecução de patrimônio do devedor, a fim de satisfazer o crédito reconhecido em juízo – na fase de execução), por conduzirem as audiências de instrução e estando muito mais próximos das partes e de seus respectivos patronos (considerando o número de atos processuais praticados no âmbito de suas respectivas jurisdições).

Lado outro, aos beneméritos Desembargadores e Ministros passou-se a ter um outro olhar mais amplo e macro de sua jurisdição, principalmente, no que se refere à sua atuação no âmbito do processamento e apreciação das homologações de acordos, o que se realçou posteriormente, com a promulgação da Lei n. 13.467/2017, considerando a inserção das transações extrajudiciais na legislação trabalhista, que passaram a serem submetidas ao crivo posterior da magistratura para conferir-lhe existência, validade e eficácia e que, até o momento, ainda muito se debate sobre o acerto (ou não) das decisões de mérito de origem que acabaram por não homologar ou o fazê-lo apenas em parte, restringindo a chamada autonomia privada e jurisdição voluntária das partes, o que ensejou à alçada de inúmeros recursos (ordinários e de revista), remédios constitucionais (mandados de segurança) e inclusive, ações autônomas (ações rescisórias) aos Tribunais para a sua reforma ou cassação, de modo a considerar a plenitude e integralidade das condições e parâmetros devidamente ajustados e bem acordados em autocomposição, tendo sido bem sopesados os seus interesses e dimensionado as suas possibilidades financeiras.

Mas não é só, com a vinda da nova realidade albergada pelo CPC de 2015 ao ordenamento jurídico nacional, alterando e delimitando, substancialmente, o prosseguimento e a condução da maioria das demandas já em curso e principalmente, ditando as novas balizas e parâmetros para as futuras demandas, aliado à premente e histórica necessidade de elaboração de uma legislação tipicamente trabalhista que fosse disruptiva ao contexto social, econômico e político em que se baseou a nossa CLT de 1943, ressaltou-se e evidenciou-se, com maior vigor, a atuação e extensão dos poderes dos julgadores de instâncias superiores, no caso em apreço, do TRT e do TST.

Assim, discorrido acerca destes necessários contextos histórico e jurídico que permeiam a presente temática, passemos à abordagem do mérito em tela.

Não menos importante, pois, agora adentrar no âmbito recursal – que a depender do grau de complexidade e relevância das matérias e teses fáticas e jurídicas discutidas, pode demandar um prolongamento temporal até superior àquele concernente ao processo de conhecimento, assim, consoante disposição do artigo 932, I, do CPC, há competência funcional para o recebimento, análise e apreciação das homologações de acordos, ao Relator designado para o julgamento do recurso já alçado à Turma da qual seja integrante.

Chama-se a atenção, portanto, que com o advento do CPC de 2015, consagrou-se a certeza da positividade quanto à atuação dos Relatores em homologar os acordos levados ao seu crivo, o que não significa dizer que a CLT nada referisse neste ínterim. Ao contrário, do cotejo dos artigos 764 e 860, já se vislumbrava uma abordagem – embora parcialmente distinta – acerca da atuação dos Tribunais na homologação de autocomposições.

Uma das grandes discussões que se instauram sobre a homologação de acordos no âmbito dos Tribunais e não nos juízos de origem, diz respeito àqueles casos em que há execuções provisórias já em curso em primeiro grau, o que poderia resultar em um “tumulto processual”, ao se proferir decisões múltiplas em instâncias distintas e até em desconformidade ao já decidido em outra instância.

O receio de supressão de instância aqui fica evidente, ao revés, também não se terá plena certeza acerca da conclusão a ser atribuída no tocante aos recursos já interpostos.

O ilustre e renomado professor e jurista ‘Ricardo Calcini’, em sua digníssima obra “Prática Trabalhista nos Tribunais – TRT’s e TST”, publicada em 2021 pela editora Mizuno, assim melhor define esta controvérsia jurídica (teórica e prática):

“Se por um lado, a norma não impõe sua necessária homologação pelo Desembargador no TRT ou pelo Ministro no TST, lado outro igualmente não impede tal conduta. Note-se que a referência feita pelo legislador ordinário não cria dúvidas no sentido de que a competência para a homologação da avença seja efetivamente do Tribunal, mas, em casos específicos, como a situação citada de uma execução provisória, melhor será que os autos sejam baixados para a Vara do Trabalho.

Todavia, o escopo da lei não é chancelar a conduta do Relator que, a toda e qualquer avença, se socorra ao Juiz de Primeiro Grau para que proceda com a sua correspondente homologação. Até porque, se os autos retornarem para a Vara de Origem, haverá dúvidas existentes acerca do desfecho dos recursos que estavam pendentes de julgamento pelo próprio Tribunal Regional do Trabalho ou no âmbito do Tribunal Superior do Trabalho.” (sem negrito no original)

A situação é ainda mais complexa, se porventura, deixar o juízo de origem de homologar a composição ou o fazer apenas parcialmente – conforme já abordado anteriormente – o que poderá resultar na interposição de recursos ordinários e de revista por ambas partes litigantes, entretanto, o que dizer da destinação dos recursos que já haviam sido interpostos antes do protocolo da minuta de acordo, leia-se, antes de o Tribunal devolver os autos à origem para a apreciação da avença?!

E mais, e se já existente acórdão proferido e publicado quando da apresentação da minuta de acordo ao Tribunal, no curso de prazo para a interposição de recurso posterior, como no caso de recurso de revista ou embargos para a SBDI, isso sem falar nos embargos de declaração com efeitos infringentes?!

Neste viés, o próprio TST ao editar a Súmula n. 418, já reconheceu impertinência de impetração de mandado de segurança quando não homologada a avença, mormente não tratar-se de direito líquido e certo.

Diante desta imensurável insegurança jurídica, entende-se recomendável, pois, a oposição de embargos de declaração – mesmo se tratando de decisão interlocutória (inteligência do ‘caput’ do artigo 1.022 do CPC) quando da prolação de despacho pelo Relator – que devolve os autos à origem, para a apreciação da avença, se em sua decisão nada referir acerca da destinação e efeitos dos recursos já interpostos e pendentes de julgamento e/ou acerca do prazo recursal em vigor em face de acórdão já publicado, principalmente, por não haver inequívoca garantia de que os autos retornariam à instância superior para o julgamento dos ditos recursos, se não homologada a avença na origem, por exemplo, se verificado prejuízo material ao reclamante, atentado à lisura de normas de ordem pública, transação de direitos indisponíveis e afins.

Nesta toada, o mais adequado, coerente e seguro juridicamente, seria que o Relator ao receber a proposta de autocomposição dos litigantes, realize a sua análise e apreciação, evitando os mencionados “desencontros” e “incompatibilidades” de decisões proferidas em instâncias distintas, quase que, concomitantemente. Inobstante, plenamente cabível a interposição de recurso em face da decisão do Relator que, embora não remetendo os autos à origem, no seu íntimo entende por não homologar o acordo. Neste trilhar, importante analisar o cabimento do Agravo Regimental no âmbito daquele Tribunal, alçando a apreciação e análise ao Colegiado.

Por fim, de se rechaçar, juridicamente, a homologação de acordos parciais perante o juízo origem, o que constituiria um título executivo judicial – de modo que o trânsito em julgado do termo de conciliação coincidiria com a data de sua homologação, ainda que parcial (Súmula n. 100, V, TST), retirando das partes litigantes, o seu direito ao intento recursal, consoante artigo 831 da CLT – termo conciliatório este, que só poderia ser desconstituído apenas por meio de distribuição de ação rescisória especificamente enquadrada em uma das hipóteses legais preconizadas no artigo 966 do CPC e em conformidade aos verbetes da Súmula n. 100 do TST.

Em síntese, o entendimento mais justo, adequado e consagrador das garantias constitucionais diante da controvérsia aqui posta é, de que, principalmente, em face da limitação das hipóteses de cabimento e de interposição das medidas recursais admitidas no processo do trabalho, que o próprio Relator proceda à análise, apreciação e julgamento da homologação (ou não) da avença remetida ao seu crivo ou, se assim não o fazendo – remetendo os autos à origem, que o magistrado lá competente, venha a decidir pela sua integral homologação ou a rejeite, plenamente, eliminando, assim, eventuais posicionamentos inclinados pela parcial homologação, diante dos elencados prejuízos processuais, ora debatidos – trânsito em julgado da decisão e impossibilidade de interposição de recurso.